quinta-feira, 21 de maio de 2009

Dia 23 - NY parte 6 (continuação)

Vamos dar prosseguimento ao último post, agora com o lado triste da história =P


NOVA YORK, 23º DIA - PARTE RUIM


Quem leu esse blog desde o começo percebeu que o roteirista da minha viagem parece ter um gosto por comédia pastelão. Ou então assistiu muita sessão da tarde... o vigésimo terceiro dia é uma prova viva disso.


Como já disse, eu tinha deixado pra terminar as compras nesse dia antes de pegar meu voo de volta pra casa às 16hs. Mas quero deixar claro uma coisa, quase todas as compras eram encomendas. Infelizmente o orçamento já tinha estourado faz tempo e não deu pra comprar muita coisa pra mim (vontade não faltou).


É recomendado chegar ao aeroporto com 2hs de antecedência para voos internacionais. Isso significa que eu deveria sair do albergue lá pelas 13hs pra dar tempo tranquilo. Eu sabia disso, mas nem adiantava acordar muito cedo pq as lojas costumam abrir por volta das 9hs. Então me programei pra sair do albergue umas 8:30 e fui terminar o que tinha que fazer.


A essa altura já fica claro que a viagem deixou de ser lazer e se tornou uma lista chata de tarefas que eu tinha que cumprir, mas divago...


Fiz o máximo de coisas que pude de modo que eu conseguisse voltar pro albergue até as 11hs, horário máximo do check out. Se eu me atrasasse teria que pagar multa. Dei uma passadinha numa loja e comprei uma genial mala descartável com rodinhas por 14 dolares. Minha mega mochila já estava entupiada até a boca e não tinha como carregar as tralhas novas sem uma outra mala.


Acabei chegando no hotel 11:05 e avisei na recepção que só ia pegar minhas coisas e já voltava pra fazer o check out. Fui até o quarto e tentei obrar o milagre da multiplicação dos espaços pra ver se cabia tudo. Eu tirava coisa de uma mala, colocava na outra. Botava coisa na mochila, amassava, apertava, chutava, pisava em cima, etc. E nada de caber tudo. Com muito sufoco consegui otimizar o espaço de modo que as coisas ficassem la dentro. Apanhei as tralhas todas e desci as escadas pra fazer o check out.


Foi um sufoco tremendo andar do quarto até a recepção. O prédio do albergue é super antigo, com corredores estreitos e portas minusculas. Como eu estava com o mega mochilao nas costas e mais a mochila na frente e ainda arrastando a nova mala, sempre tinha que fazer mil contorcionaimso pra passar pelas portas. Como ainda era cedo, fiz o check out e deixei minhas coisas guardadas no albergue enquanto cumpria as 4 últimas tarefas:


1) Ir na Fao Scwarz


2) comprar o boné que meu sobrinho pediu


3) comprar as encomendas eletrônicas: 2 xbox e um nintendo ds (que eu não podia deixar guardadas o albergue, então tinha que deixar pro último dia)


4) chocolates do povo da Folha


O primeiro item, como vocês viram no post anterior, eu cumpri. O segundo foi o inicio do martirio que transformou esse dia no mais terrível de toda a viagem.


Logo que saí da Fao Scwarz, me apressei pra comprar o que faltava. Fui entrando em todas as lojas onde eu achava que podia vender o tal boné que ele queria, mas tudo o que achei foram bonés cretinos que mais pareciam lembrancinhas de viagem. Percebi que nunca ia achar o bendito boné.



Pra minha sorte tinha uma Gamestop bem perto dali. Pro meu azar só tinha 1 xbox disponível. Foi então que me lembrei de um detalhe irrelevante: a hora. Logicamente que entrei em desespero quando percebi que ja eram 13:35 e, teoricamente, eu já deveria estar no aeroporto. Como eu nao tinha outra saída, peguei um taxi pela primeira vez na viagem e pedi pra ele me levar de volta pro hotel. Quando estava quase chegando vi uma loja da Blockbuster e pedi pra ele me deixar ali mesmo. Pro meu azar também não tinha Xbox lá e muito menos Nintendo DS. Eu já estava quase desistindo e pensando no prejuízo que minha displicência ia causar quando vejo, do outro lado da rua, mais uma loja da Gamestop. Yes! Viva NY e suas lojas de games em cada esquina.


Dessa vez eles tinham tudo o que eu queria. Peguei a muamba toda e fui voando pro hotel. Infelizmente não havia mais tempo pra comprar os chocolates. Que bom que o povo da Folha entendeu e me ama mesmo assim =P


Se já estava dificil arrumar as malas antes, imagina agora com aquelas duas caixas enormes do xbox. Sinceramente não consigo lembrar dos detalhes, mas de alguma forma eu espremi tudo de uma maneira que pelo menos um deles coube na mala.


Nesse momento minha configuração era a seguinte:


costas: mega mochila

frente: mochila normal

mao direita: arrastando a mala de rodinha

mao esquerda: segurando a sacola com o xbox que nao coube na mala


Saí do hotel 14:20 (o voo era as 16hs), desperado atrás de um taxi. A famosa lei de smurf fez com que abolsutamnte NENHUM taxi se dignasse a parar pra mim, mesmo me vendo naquela situação desesperadora coberto de malas.


Caminhei até a Broadway na esperança de que fosse mais fácil achar Taxi em uma avenida mais movimentada, até que finalmente consegui um.


Desembarquei na Penn Station e corri desesperdamente pra bilheteria. A moça me informou que o próximo trem sairia em 1 minuto. Foi a deixa pra eu voar pelas escadas e embacar no trem a tempo de ver as portas se fechando atrás de mim.


Quando cheguei no aeroporto o meu maior medo se conretizou: a fila do check in estava enorme. Bravamente tomei meu lugar na fila e esperei pela minha vez. Tudo isso só pra descobrir que eu estava na fila errada.


Tudo bem, sem desesperos. Fui pra fila correta, quando estava quase chegando a minha vez novamente, tiraram todo mundo da fila e levaram pra outra. Agora já não dava mais pra manter a calma e pedi pelamordedeus pro povo me deixar passar na frente.


O senhor que estava no primeiro lugar da fila, muito gentil, perguntou pra onde eu estava indo. Pensei em responder Argentina pra nos livrar do vexame, mas resolvi dizer que ia pro Brasil mesmo. "Lucky guy", ele disse. E praticamente me empurrou pro balcâo de check in enquanto eu timidamente vacilava na hora de furar a fila. Detalhe que ele fazia isso enquanto vociferava: "Ele vai perder o voo!!! deixem ele passar na frente!!! É brasileiro!!!!"


Mas já era tarde demais... quando cheguei no balcâo o atendente friamente me disse: "you've missed your flight, boy"


Meu mundo desabou. Comecei a pensar nas milhões de taxas que teria que pagar pra remarcar voo, mais diaria de hotel, comida, etc. Enfim, todo o prejuizo que aquilo ia me causar.


-O que devo fazer agora?, perguntei

- remarcar teu voo, provavelmente pra daqui vários dias pq tá tudo lotado.


Foi então que, ao olhar no crachá do cara, vi que ele se chamava "José da Silva*". Peraí, pensei, esse nome não pode ser gringo. Foi então que, espertamente, mostrei meu passaporte brazuca pra ele.


Esse simples fato fez com que o semblamente do cara se transformasse tal como o céu que se abre após a tempestade, deixando até mesmo um arco iris no céu (como sou poético... haha)


Mas é sério! Quando ele descobriu que eu era contarrâneo começou a fazer tudo o que podia pra resolver meu problema. Ligou pra fulano, beltrano, sicrano, trajano, etc. Digitou mil códigos diferentes no terminal, tentou, tentou, tentou, até que....


Bom, eu estava nos EUA, correto? Existe coisa mais clichê no clímax de filmes americanos do que um final feliz depois de todo o drama? Pois bem, o roteirista da minha viagem acabou mostrando que não era tâo fã de sessão da tarde.


Depois de tudo aquilo, o cara levantou o rosto e com semblante consternado me informou que não tinha jeito. Não havia lugar disponível em nenhum voo pra Hosuton (onde seria minha conexâo pro Brasil). Ele disse que tudo o que poderia fazer era remarcar o voo pro dia seguinte, sem custo adicional.


Claro que aquilo me deixou triste, mas pelo menos eu não ia pagar taxa adicional e ainda ia ficar mais um dia em NY. Poxa, não podia ser tão ruim, né?


Mas ainda não tinha acabado....


Quando senti uma pontada nas costas me lembrei de que estava com 200kg de tranqueiras penduradas em mim. E ainda ia carregar aquilo por um bom tempo, pq tinha que voltar pro hotel


Peguei o trem de volta pra Manhttan e desembarquei na Penn Station. Ela fica a uns 4km do hotel (40 minutos de caminhada). Era absolutamente impossível carregar aquilo tudo por uma distância tão grande. E tem mais. a alça da sacola do xbox já tinha há muito tempo deixado de ser uma alça e se transformado numa espécie de navalha que ia deixando vergôes na minha mão, me obrigando a revezar o tempo todo o lado em que eu a segurava.



Como eu não estava preparado para esse incidente, não tinha dinheiro nenhum no bolso pra pagar o taxi. "Mas isso não será problema", pensei, ao avistar um caixa eletrônico do outro lado da rua. Aquela maravilha tecnológica iria me prover com todo o dinheiro que eu precisasse.


Mas o roteirista pastelão adora ver o personagem se ferrar. Digitei minha senha e esperei alegremente pelo dinheiro que deveria sair, enquanto a tela dizia "processando...". Eu devia ter notado que aquilo estava demorando mais que o habitual, mas nada poderia me preparar pra mensagem "cartão recusado" que apareceu em seguida.


Tentei em outros caixas eletrônicos e deu a mesma coisa. Era oficial, eu estava sem um tostão no bolso, sem cartão de crédito, sobrecarregado com 300 malas e longe pra caramba do hotel.


Ah, e estava chovendo também...


Percebi que reclamar não ia levar a nada e comecei a andar. Eu estava na 32th street, o hotel ficava perto da 3rd street. Aquela seria a pior contagem regressiva da minha vida.


Andei, andei, andei... fiquei um tempão andando e quando olho pra placa vejo que ainda estou na 29th street!


Claro que minhas costas estavam destruídas por todo aquele peso que eu carregava. Isso era agravado pelo fato de eu ter que andar meio torto enquanto puxava a mala de rodinhas com uma mão e segurava o xbox e sua sacola assassina na outra. Tudo isso enquanto eu começava a ficar ensopado.


E o desespero aumentava quando percebia que o hotel ainda estava terrivelmente longe.


Foi então que algo incrível aconteceu: No meio de todo aquele desespero eu pensei: "puxa vida! Não é possível que possa acontecer tanta desgraça com uma pessoa em um dia só! Perdi meu voo, meu cartão de crédito não funciona, tô lotado de malas, com as costas, os ombros e as mãos moídos e ainda por cima está chovendo e não posso molhar os xbox!!! Bem que pelo menos podia parar de chover, né?"


Vocês podem achar brincadeira, mas no exato instante em que pensei isso, a chuva, que era fina, se transformou em temporal. Começou a cair o mundo em NY e eu não tive alternativa a não ser me abrigar embaixo de uma marquise.


Já estava quase escurecendo e eu estava desolado. Todas as outras vezes que eu me dei mal durante a viagem acabou ficando divertido. Mas agora não estava. A dor era de verdade, o peso era de verdade e a frustração idem. E aquela bendita chuva nunca que passava...


E ainda tinha os companheiros homeless que dividiam a marquise comigo e já estavam de olho na minha muamba..


Mas a chuva acabou passando e retomei meu caminho. Cada passada me exigia um esforço sobrehumano; Enquanto eu tentava me manter de pé, as ruas iam caindo de número, uma a uma. 17, 16, 15... 6... 5... 4... e então finalmente cheguei na 3rd street.


Consegui um quarto e desabei na cama. Cada movimento que eu fazia com as costas resultava numa dor imensa. Cheguei a achar que provavelmente eu tinha lascado minhas costas pra sempre. Não quero descrever o estado dos meus pés, pq seria disgusting... como a sola estava em carne viva, ela praticamente entrou em simbiose com a meia molhada, resultando numa dor horrível na hora em que foi tira-la


Deixo claro que estou relativizando bastante os fatos aqui. Só estando no meu lugar, naquele momento, pra saber o que eu passei.


Mas, engraçado, agora que o tempo passou e tudo parece tão distante, não consigo mais enxergar o mesmo drama que senti no momento. Pelo contrário, só consigo dar risada da minha própria burrice.


Acho que, no fundo, todo mundo gosta de uma comédia pastelão. Pois deixo aqui meus parabéns ao roteirista! E depois que ele tirou o final feliz da história, então, passei a admira-lo ainda mais.


É isso. Até o próximo post com o fim (real) da viagem.



* nome alterado pra não criar problemas.



Como esse post não tem imagens, deixo essa tirinha que resume bem minha vida durante a viagem...

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